
Estamos a semanas do período em que ocorre a chamada “janela partidária”, ou seja, o prazo no qual parlamentares podem mudar de partido sem perder o mandato. Em 2022, a “janela” ocorrerá de 03 de março a 01 de abril.
Impacto da Janela Partidária
Para que se tenha uma ideia do impacto do instituto da “janela partidária” no funcionamento do sistema partidário brasileiro basta com saber que na legislatura 2015/2018, a primeira com tal possibilidade, 163 dos 513 parlamentares eleitos (as) mudaram de partido. Assim, 31,5% dos Deputados e Deputadas Federais deixaram os partidos pelos quais foram eleitos.
Abaixo ver-se-á como na vigência da Constituição de 1988 foi adotado pelo ordenamento jurídico o conceito da fidelidade partidária e, como foram regulamentadas as possibilidades de troca de partido sem perda de mandato e, particularmente a “janela partidária”.
Fidelidade Partidária
A Constituição da República não prevê expressamente o princípio da fidelidade partidária. No entanto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ao responder à Consulta n. 1398, realizando interpretação sistemática do texto constitucional, firmou entendimento de que o mandato pertence aos partidos políticos ou à coligação e não ao parlamentar eleito ou eleita.
A compreensão foi acolhida pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar os mandados de segurança de n. 26.602, n. 26.603 e n. 23.604. Posteriormente aos julgamentos antes referidos o TSE, através da Resolução n. 22.610/07, regulamentou o procedimento para perda de mandato por infidelidade partidária.
A intepretação do TSE sobre o alcance da fideliadade partidária e, portanto, da sanção aos atos de infidelidade, acabou por abranger não apenas os parlamentares, mas igualmente os detentores (as) de mandatos no Executivo como, por exemplo, governadoras, governadores , prefeitas e prefeitos e seus vices.
Em 2015, o STF ao apreciar a ADI n. 5.081/DF, relator o Ministro Luiz Barroso, concluiu pela impossibilidade da perda de mandato em situações de infidelidade partidária em eleições majoritárias por “ofensa ao princípio da soberania popular”. Em consequência, a partir daí somente foi possível discutir da perda de mandato por ato de infidelidiade praticado por parlamentar.
Lei dos Partidos: Fidelidade Partidária , Perda de Mandato e Janela Partidária
A Lei dos Partidos, em decorrência de alteração legislativa promovida pela Lei n. 13.165/15, deu status legal a fidelidade partidária, pois em seu artigo 22-A determina que “perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito”.
No entanto, a norma referida estabelece hipóteses de justa causa para a desfiliação, são elas:
- Mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;
- Grave discriminação política pessoal; e
- Mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.
A última das hipóteses acima mencionadas, é conhecida como “janela partidária”.
Em todas as situações acima o parlamentar poderá, em tese, desfiliar-se sem que, no entanto, tenha cassado sem mandado pelo partido politico através do qual foi eleito ou eleita.
Clausula de Barreira e Janela Partidária
A Constituição da República, em decorrência da Emenda n. 97/1017, incorporou ao ordenamento jurídico a figura da “cláusula de barreira”, ou seja, o instituto que limita o acesso ao Fundo Partidário e tempo gratuito de rádio e televisão aquelas agremiações que tenham obtido um número mínimo de votos ou, eleito uma quantidade mínima de parlamentares numa determinada quantidade de estados.
Ocorre que, ao fazê-lo a norma criou uma nova hipótese de “janela partidária”, eis que, permite a parlamentar de partido que não tenha atingido a “cláusula de barreira” filiar-se a agremiação que a tenha atingido. Veja-se:
Dispôs a Constituição Federal:
Art. 17.
(…)
§ 3º Somente terão direito a recursos do Fundo Partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei, os partidos políticos que alternativamente:
I – obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 3% (três por cento) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 2% (dois por cento) dos votos válidos em cada uma delas; ou
II – tiverem elegido pelo menos quinze deputados federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.
(…)
§ 5º Ao eleito por partido que não preencher os requisitos previstos no § 3º deste artigo é assegurado o mandato e facultada a filiação, sem perda do mandato, a outro partido que os tenha atingido, não sendo essa filiação considerada para fins de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e de acesso gratuito ao tempo de rádio e de televisão.
Assim, ademais das hipóteses previstas na Lei dos Partidos como justa causa para desfiliação (mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação política pessoal; e mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente) tem-se a possilidade de desfiliação sem perda de mandato naquelas situações nas quais o partido não tenha atingido o piso fixado pela cláusula de barreira.
Janela Partidária em 2022
Uma dúvida frequente a motivar variadas consultas é saber quem são os parlamentares que podem valer-se da “janela partidária” para desfiliar-se sem risco de perda de mandato.
Em 2022, se pergunta: as deputadas e deputados podem se desfiliar no perído da “janela”, mas as vereadoras e vereadores também o podem?
Em 2018, o Tribunal Superior Eleitoral, resposdeu a essa pegunta por ocassião de consulta que lhe foi formulada. Vejamos:
Na Consulta nº 060015955.2018.6.00.0000, o TSE decidiu que “a hipótese de justa causa de que trata o art. 22-A, III, da Lei 9.096/95 somente se aplica ao eleito que esteja ao término do mandato vigente, o que não se verifica em relação a vereador que se desfilie para concorrer nas eleições gerais subsequentes à respectiva posse no mandato municipal”
Conforme explica a resposta a Consulta:
Em primeiro lugar, a desfiliação deve ocorrer dentro do prazo de trinta dias imediatamente antes da data limite para a filiação ao partido político exigido para concorrer na eleição.
Em segundo lugar, essa possibilidade somente caberá àquele que estiver em término de mandato, nos estritos termos da lei. Isso quer dizer que um vereador, prefeito ou vice-prefeito poderá se desfiliar de seu partido, com justa causa, no prazo da janela partidária que coincidir com o final de seu mandato, ou seja, nas vésperas das eleições municipais.
Do mesmo modo, o detentor de cargo de deputado estadual, deputado federal, senador, governador ou presidente da República também poderá se desfiliar de seu partido, fazendo jus ao exercício do direito à janela partidária naquele período em que coincidir com o término do seu mandato, o que necessariamente ocorrerá nas proximidades de uma eleição geral.
Assim, a “janela partidária” ocorrerá apenas para que eleitos e eleitas para Câmara Federal e Assembleias Legislativas mudem de partido para concorrer às eleições gerais e, para que eleitos e eleitas para Câmaras Municipais troquem de partido e disputem as eleições municipais por agremiação distinta daquela pela qual se elegeram.
Desta maneira, em 2022 somente podem se valer do instituto da “janela partidária” parlamentares que estejam no exercício de mandatos na Câmara Federal ou Assembleia Legislativa.
As vereadoras e vereadoras que desejarem se desfiliar das agremiações pelas quais foram eleitas deverão o fazer se valendo das hipóteses de justa causa para desfiliação (mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário e/ou grave discriminação política pessoal). Caso desejarem se utilizar da “janela partidária” deverão aguardar a chegada de 2024, ano das próximas eleições municipais, para no prazo “de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente”, se desfiliarem do partido pelo qual foram eleitas e eleitos.
Em síntese, como dizem as gentes: “cada um no seu quadrado”.
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