TSE reconheceu o abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação por reunião convocada com embaixadores. Braga Netto foi excluído da sanção.

Confira  o relatório do processo, votos dos ministros e ministra e assista vídeo com a integra do ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE.

Hoje às 14h e 23 minutos, depois de 04 sessões (ias 22, 27, 29 e 30 de junho) foi encerrado o julgamento da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) que pedia a inelegibilidade de Jair Bolsonaro e de Walter Braga Netto, candidatos à Presidência da República nas Eleições 2022.  Bolsonaro foi condenado por abuso de poder, inelegível por 08 anos a contar das eleições de 2022. Braga Netto foi absolvido.

O ponto de partida foi a apresentação do relatório pelo corregedor-geral eleitoral, ministro Benedito Gonçalves. Na sequência, a sustentação oral pelo representante do Partido Democrático Trabalhista (PDT), autor da ação, e a defesa feita pelo advogado que representou Bolsonaro e Braga Netto. Também foi anunciado o parecer do Ministério Público Eleitoral (MP Eleitoral) pelo vice-procurador-geral eleitoral Paulo Gonet Branco. Ele opinou pela inelegibilidade somente de Bolsonaro e para que fosse absolvido Braga Netto.

A segunda sessão foi destinada exclusivamente ao extenso voto do relator, que analisou detalhadamente o caso e fez uma rigorosa avaliação de todas as provas produzidas ao longo da instrução do processo. Na terceira sessão votaram os ministros Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares. Já a última sessão foi destinada aos votos da ministra Cármen Lúcia, do ministro Nunes Marques e do ministro Alexandre de Moraes.

MP ELEITORAL: PARECER PELA INELEGIBILIDADE DE BOLSONARO

Na sessão de julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ocorrida no dia 22 de junho o parecer do Ministério Público Eleitoral, apresentado pelo vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, foi pela parcial procedência da ação do Partido Democrático Trabalhista (PDT), para que seja declarada a inelegibilidade somente de Bolsonaro e para que seja absolvido o então candidato a vice-presidente, “a quem não se aponta participação no caso”. O parecer ocorreu logo após a acusação e a defesa apresentarem os respectivos argumentos.

VOTOS MINISTROS E MINISTRA

Ministro Benedito Gonçalves

O ministro relator da ação, Benedito Gonçalves, votou pela parcial procedência da ação ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), houve responsabilidade direta e pessoal de Bolsonaro ao praticar “conduta ilícita em benefício de sua candidatura à reeleição”. O prazo de inelegibilidade é contado a partir das Eleições Gerais de 2022. O ministro excluiu o então candidato à Vice-Presidência Braga Netto da sanção de inelegibilidade em razão de não ter sido demonstrada sua responsabilidade na conduta.

Confira o relatório do voto do ministro Benedito Gonçalves

Confira a íntegra do voto oral do ministro Benedito Gonçalves.

Os ministros Floriano de Azevedo Marques (leia a íntegra), André Ramos Tavares (leia íntegra) acompanharam o voto de relação sendo.

Ministra Cármen Lúcia

A vice-presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, ao votar pela inelegibilidade de Jair Bolsonaro acompanhando o relator, afirmou que a reunião entre o então presidente e embaixadores estrangeiros, em julho de 2022, foi um monólogo de caráter eleitoreiro em que Bolsonaro lançou dúvidas, sem qualquer prova, sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas e da Justiça Eleitoral, condutora das eleições.

“Não há democracia sem o Poder Judiciário independente. Os ataques não tinham razão de ser, a não ser desqualificar a Justiça Eleitoral, o próprio Poder Judiciário e atacar a própria democracia”, disse Cármen Lúcia.

A ministra salientou que, na ótica qualitativa da gravidade da conduta, o então presidente fez uso indevido dos meios de comunicação, com a transmissão do evento feita ao vivo pela emissora estatal TV Brasil e também em redes sociais. No aspecto quantitativo, Cármen Lúcia disse que a divulgação do encontro de Bolsonaro com os diplomatas alcançou um número expressivo de pessoas que votariam nas eleições, que ocorreriam dali a três meses.

Divergência

O votos  divergentes do voto do relator que, portanto, deram pela não condenação de Bolsonaro foram proferidos pelos ministros Raul Araújo (leia a íntegra) e Kassio Nunes Marques. Estes consideraram que o discurso feito por Bolsonaro aos embaixadores não teve gravidade suficiente para quebrar a igualdade entre futuros candidatos ao pleito nem influenciar negativamente o comparecimento massivo de eleitores às urnas eletrônicas nas eleições de 2022.

VOTO DO PRESIDENTE DO TSE: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES

Ministro Alexandre de Moraes

Último a se manifestar, o ministro Alexandre de Moraes também acompanhou integralmente o relator. Ele lembrou que Bolsonaro violou parâmetros definidos pelo Tribunal desde 2021 sobre condutas que eventuais candidatos às Eleições 2022 não deveriam incorrer, no sentido de tentar desacreditar o sistema eletrônico de voto perante a população, em um ataque direto à Justiça Eleitoral e à própria democracia. O Plenário já havia definido que tal conduta poderia ser considerada abuso de poder.

“Isso ficou pacificado e como um alerta para se evitar exatamente o que estamos fazendo hoje que é evitar o descumprimento do que já era pacífico gerasse a inelegibilidade daqueles que insistissem em praticar esses ilícitos eleitorais”, explicou Moraes.

Durante o episódio debatido na Aije, de acordo com o ministro, o então candidato à reeleição fez mau uso da função para o qual foi eleito e deturpou a atribuição a ele conferida quando:

  • organizou o evento, convocou embaixadores utilizando-se do cargo e do cerimonial da Presidência a menos de dois meses do primeiro turno das Eleições Gerais de 2022;
  • empregou recursos públicos e a estrutura do Palácio da Alvorada;
  • transmitiu o encontro com estrangeiros ao vivo pela TV Brasil;
  • propagou o vídeo pelas redes sociais com o objetivo de levantar dúvidas sobre o voto eletrônico e insuflar eleitores contra a Justiça Eleitoral e as demais candidaturas

“Um presidente da República que ataca a Justiça Eleitoral, ataca a lisura do sistema eleitoral que o elege há 40 anos? Isso não é exercício de liberdade de expressão. Isso é conduta vedada. E, ao fazer isso utilizando-se do cargo de presidente, do dinheiro público, da estrutura do Alvorada, da TV pública é abuso de poder. E, ao preparar tudo isso para imediatamente bombardear o eleitorado via redes sociais é uso indevido dos meios de comunicação”, pontuou.

Segundo o ministro Bolsonaro organizou a reunião “a toque de caixa”: “De oficial só o desvio de finalidade praticado pelo presidente da República. Itamaraty não organizou, Casa Civil não participou. Monólogo eleitoreiro. Pauta dele, pessoal, eleitoreiro”, disse.

“Toda a produção foi feita para que a TV Brasil divulgasse mas, mais do que isso, para que a máquina existente de desinformação nas redes sociais multiplicasse essas informações, para que se chegasse diretamente ao eleitorado, como chegou”, disse.

Todos os atos, segundo Moraes, ocorreram de forma encadeada, seguindo um plano traçado com claro objetivo de atacar a credibilidade das instituições democráticas brasileiras e influenciar negativamente o eleitorado. Na avaliação do ministro, a resposta dada pelo TSE durante a análise do caso confirma a fé no Estado Democrático de Direito e na democracia, além de demonstrar repúdio ao populismo “renascido a partir das chamas” dos discursos de ódio e que disseminam desinformação.

Ainda de acordo com Moraes, seria “ingenuidade ou hipocrisia” achar que a reunião não teria impacto eleitoral por ter como público-alvo embaixadores, sem direito ao voto no Brasil.

Moraes afirmou que não é liberdade de expressão o ataque à lisura do sistema eleitoral, e que o discurso do ex-presidente foi um “encadeamento de mentiras”. “Liberdade de expressão não é ataque ao poder Judiciário e à sua independência, principalmente por um presidente da República”, afirmou.

RESULTADO DO JULGAMENTO

Por maioria de votos (5 a 2), o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral declarou a inelegibilidade do ex-presidente da República Jair Bolsonaro por oito anos, contados a partir das Eleições 2022. Ficou reconhecida a prática de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação durante reunião realizada no Palácio da Alvorada com embaixadores estrangeiros no dia 18 de julho do ano passado. Walter Braga Netto, que compôs a chapa de Bolsonaro à reeleição, foi excluído da sanção, uma vez que não ficou demonstrada sua responsabilidade na conduta. Nesse ponto, a decisão foi unânime.

A decisão também será comunicada imediatamente à Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE), para que analise eventuais providências na área penal; ao Tribunal de Contas da União (TCU), devido ao provável emprego de bens e recursos públicos na preparação de eventos em que se consumou o desvio de finalidade eleitoreira; ao ministro Alexandre de Moraes, relator, no Supremo Tribunal Federal (STF), dos Inquéritos nº 4878 e nº 4879; e ao ministro Luiz Fux, relator da Petição nº 10.477, para conhecimento e providências que entender cabíveis.

Ao proclamar o resultado, o presidente do TSE fez uma defesa firme da Justiça Eleitoral e do sistema eletrônico de votação, vigente no país desde 1996. Moraes advertiu contra as mentiras e a desinformação propagadas por indivíduos, grupos e ocupantes de cargos eletivos, com a finalidade de desacreditar, sem qualquer prova, a integridade das urnas eletrônicas, visando desestabilizar a própria democracia.

Cabe recurso ao STF.

Processo relacionado: AIJE 0600814-85.2022.6.00.0000

Com TSE.