O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indeferiu, por maioria de votos (6 a 1), o registro de candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para disputar as eleições à Presidência da República em outubro.
Também por maioria (5 a 2), o colegiado decidiu facultar à Coligação O Povo Feliz de Novo (PT/PCdo B/Pros) a substituição de seu candidato a presidente no prazo de 10 dias. Os ministros proibiram a Lula a prática de atos de campanha, incluindo a veiculação de propaganda eleitoral no rádio, na televisão e em outros meios de difusão de informação, como internet e redes sociais, até que ocorra sua eventual substituição. Os ministros também determinaram a retirada do nome do ex-presidente da República da programação da urna eletrônica de votação.
O pedido de registro de Lula foi questionado no TSE por impugnações, notícias de inelegibilidade e ações de impugnação de mandato, num total de 17 processos. As demandas foram apresentadas pelo Ministério Público Eleitoral (MPE), por candidatos e partidos adversários e outros.
Voto de Barroso
Antes de proferir seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso esclareceu as razões que o levaram a pedir a convocação da sessão extraordinária dessa sexta-feira (31) e a realizar o julgamento do pedido de registro. Segundo ele, não havia qualquer razão para o TSE contribuir para a insegurança jurídica e política do país por meio da ampliação do prazo para julgamento do pedido de registro de candidatura.
O ministro Barroso fez um histórico da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010.
A alegação central da defesa foi rejeitada pelo ministro Barroso. Os advogados argumentaram que a medida cautelar emitida pelo Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações (ONU) no último dia 17 teria provocado a suspensão da inelegibilidade decorrente da condenação de Lula pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), constituindo fato superveniente suficiente para afastar qualquer obstáculo à sua candidatura, nos termos do artigo 26-C da Lei Complementar nº 64/1990. Segundo o relator, apesar da importância do órgão para a garantia dos direitos humanos no plano internacional, suas recomendações não têm força vinculante, ou seja, a Justiça brasileira não está obrigada a cumpri-las.
Defesa e PGR
No início do julgamento, os advogados de Lula questionaram a Corte pela celeridade do julgamento – que pautou a discussão já para esta sexta-feira – sem dar prazo para a defesa apresentar alegações finais, como feito no julgamento de outros processos de impugnação de candidaturas, como a de Geraldo Alckmin.
“O critério que eu adotei foi o de ter esta matéria definida até o início da campanha eleitoral gratuita”, disse Barroso.
Antes do voto de Barroso, os advogados responsáveis pelas contestações do registro de Lula fizeram as suas sustentações orais.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge – a primeira a entrar com pedido para que Lula não possa concorrer à presidência, afirmou que a decisão do Comitê Direitos Humanos da ONU não é da competência da Justiça Eleitoral e citou jurisprudência do STF, em decisão do ministro Celso de Mello, que, segundo a procuradora, não reconhece tratado internacional que não tenha sido incorporada à legislação doméstica.
Defesa de Lula
Na sequência, a defesa de Lula argumentou que não compete à Justiça doméstica se sobrepor à decisão do Brasil de se juntar ao pacto. “O Brasil assinou o protocolo adicional em um ato de Estado. E isso foi ratificado pelo Congresso Nacional”, disse a advogada Maria Cláudia Bucchianeri.
A defesa afirmou que o Estado brasileiro já manifestou compromisso em cumprir as decisões do Comitê de Direitos Humanos da ONU – peça central do argumento do ex-presidente sobre seu direito a se candidatar.
“O comitê é parte integrante do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. Tratados internacionais não são firmados pelo governo, e sim pelo Estado”, disse a advogada de Lula.
Também em resposta à Procuradoria Geral da República, a advogada afirmou que a PGR “sempre foi parceira no direito intransigente do cumprimento dos tratados internacionais de direitos humanos”.
Outro representante da defesa do ex-presidente, Luiz Fernando Pereira, que a candidatura sub júdice tem direito a continuar no horário eleitoral e na urna eletrônica até exauridos os recursos. Segundo advogado, há mais de 70 decisões do TSE nesse sentido.
Votos
Antes da manifestação dos demais integrantes do colegiado, em preliminar, por quatro votos contra três, os ministros negaram o pedido da defesa de Lula para adiar o julgamento para que as partes que impugnaram o registro pudessem se manifestar e para que o Ministério Público Eleitoral oferecesse um parecer final. De acordo com o relator do pedido de registro, não havia necessidade de se abrir novo prazo para alegações finais, visto que não houve apresentação de provas.
Os ministros Jorge Mussi , Og Fernandes, Admar Gonzaga m Tarcisio Vieira de Carvalho de Carvalho Neto e, a presidente do TSE, ministra Rosa Weber acompanhara o relator.
Divergência
Ao divergir do relator, o ministro Edson Fachin afirmou que a falta de decreto executivo dando efetividade ao Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos não pode comprometer a sua aplicação em território nacional porque as suas disposições têm efeito supralegal, ou seja, estão hierarquicamente abaixo da Constituição, mas acima da legislação ordinária. Segundo o ministro, por esse motivo não se pode negar eficácia à medida cautelar expedida pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU.
Embora concorde que o ex-presidente Lula deve ser considerado inelegível por força da Lei da Ficha, o ministro Fachin entende que, em razão da liminar concedida pelo órgão internacional, o ex-presidente obteve o direito de suspender a eficácia da decisão que resultou na sua inelegibilidade, por isso deve-se reconhecer seu direito de se candidatar às eleições presidenciais enquanto perdurar a medida cautelar deferida. “A segurança está acima da minha convicção individual e da convicção coletiva. O Poder Judiciário não reescreve a Constituição nem edita as leis. Cumpre as regras e as faz cumprir”, afirmou, acrescentando que não se pode produzir uma regra ad hoc (para a finalidade do caso), por mais “sensível e limítrofe que ele seja”.
Para Fachin, a decisão do Comitê da ONU e a prerrogativa prevista no parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição (que dispõe sobre garantias individuais decorrentes dos tratados internacionais do qual o Brasil é parte) garantem a Lula o direito, ainda que em caráter provisório, de se candidatar às eleições deste ano, mesmo estando preso.
Sessão Secreta
Na sessão de ontem o TSE adotou uma prática pouco comum ao Poder Judiciário: foi interrompida a sessão pública e realizada uma sessão secreta para deliberar reunidos a portas fechadas. Depois de cerca de meia hora, voltaram ao plenário com a solução acertada nos bastidores, sem expor o resultado da votação entre os sete integrantes do tribunal.
A sessão secreta do TSE foi realizada para apreciar questão levantada pela defesa da Coligação O Povo Feliz de Novo (PT/PCdo B/Pros), pois segundo esta, ao contrário do que previa o voto do ministro Barroso, relator, deveria ser a garantido a coligação o direito de manter os programas de rádio e televisão durante o prazo de 10 dias dado para substituição de Lula.
Conforme a defesa de Lula, em 2014, depois da morte do candidato do PSB, Eduardo Campos, o partido pode manter sua propaganda enquanto definia o nome que o substituiria, que acabou sendo a então candidata a vice, Marina Silva.
Foi dado um prazo de dez dias para a indicação de um substituto de Lula na cabeça da chapa. Haddad deve ser o escolhido. Mas, enquanto o PT não formalizar a indicação, ele poderá aparecer como vice no programa eleitoral. A defesa da Coligação anunciou que vai definir a estratégia judicial da campanha a partir de segunda-feira (3)