“Não posso falar em nome do Poder Judiciário, mas, em meu nome, como magistrado e ser humano, tocado e sensibilizado pelo que observei neste feito, peço encarecidamente desculpas”. A manifestação do juiz federal substituto Stefan Hartmann foi registrada em sentença, proferida na sexta-feira (15/4), que reconheceu o direito de uma dona de casa de Roca Sales a dividir com a viúva de seu ex-companheiro a pensão decorrente de seu falecimento, ocorrido em 1980. A ação havia sido inicialmente ajuizada na Justiça Estadual e, em 2013, passou a tramitar na 1ª Vara Federal de Canoas.
A autora ingressou com a ação em março de 2000, ocasião em que o benefício teria sido cancelado administrativamente após seu filho com o segurado completar 21 anos de idade. Na esfera judicial, o pedido foi julgado procedente em primeiro e segundo graus. Em 2009, entretanto, o processo foi anulado depois da interposição de recurso pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da informação de que a esposa já seria beneficiária da pensão.
Três anos depois, houve declinação de competência. Com o caso já tramitando na Justiça Federal, as duas mulheres solicitaram que fossem ouvidas testemunhas. Além de audiências presenciais, foram expedidas cartas precatórias.
Requisitos presentes e segurança jurídica
Ao decidir o litígio, o magistrado lembrou que são consideradas dependentes previdenciários as pessoas unidas pela convivência e afeto com o segurado. Assim, condições como matrimônio, união estável, filiação, tutela e consanguinidade seriam juridicamente relevantes para justificar a proteção previdenciária. “Se ao tempo do óbito a relação havia cessado, sem que o convivente sobrevivente estivesse recebendo pensão alimentícia por conta da cessação do convívio, não há que falar em pensão previdenciária. Do contrário, ou seja, se havia pensão alimentícia, ou outro auxílio regular como alimentos, aluguel, entre outros, estará mantida a qualidade de dependente e haverá direito à pensão previdenciária”, disse.
Ele também levou em consideração a existência de um filho do casal e os testemunhos colhidos ao longo da instrução processual, que comprovariam a convivência em comum. “É fato que o segurado instituidor da pensão manteve, por muitos anos, um relacionamento matrimonial com a esposa legítima, e, nos últimos anos, manteve relação de companheirismo com a autora, como se casados fossem. Desta última união, inclusive, resultou o nascimento de um filho. Assim, não cabe ao Poder Judiciário, neste momento, transcorridos 36 anos, modificar a situação de fato, até mesmo em virtude da necessária estabilidade das relações sociais”, avaliou.
Duração do processo
Hartmann julgou procedentes os pedidos e fixou prazo de 30 dias para a implantação do benefício, que será dividido entre as duas pensionistas. Ele ainda lamentou que a tramitação do processo tenha se estendido ao longo dos anos. “Trata-se, apenas, de realizar um exercício de alteridade e empatia – colocar-se no lugar do ser humano cujos interesses estão sendo discutidos no processo. É preciso compreender que não é possível que alguém espere tanto tempo por uma decisão judicial,”, manifestou. “Este Juízo, juntamente com toda equipe de trabalho, está sempre em busca de alternativas para aprimorar o serviço judiciário, ainda que nem todas elas sejam bem sucedidas. Afinal, a esperança é a mola propulsora das grandes mudança, e acredito firmemente que o Judiciário pode evoluir para dar melhores respostas ao jurisdicionado”, encerrou.
Fonte: JFRS