Última divulgação do cadastro de empregadores ocorreu em junho de 2014
Em dezembro do último ano, sem que houvesse nenhuma explicação, a lista suja de trabalho escravo parou de ser publicada pelo Ministério do Trabalho. A omissão motivou o Ministério Público do Trabalho (MPT) a ingressar com ação judicial para que o documento voltasse a ser divulgado, mas no dia 25/01 a pasta divulgou uma nota no sentido de que suspendeu a publicação da lista até, pelo menos, julho deste ano.
Uma liminar – concedida pela Justiça do Trabalho do Distrito Federal no dia 19 de dezembro e confirmada dia 30 de janeiro – determinou que o Ministério do Trabalho publique em até 30 dias o Cadastro Nacional de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo, a chamada “lista suja” do trabalho escravo, desde 1º de julho de 2014. Em caso de descumprimento da medida, será aplicada multa diária no valor de R$ 10 mil.
A decisão foi do juiz titular da 11ª Vara do Trabalho de Brasília, Rubens Curado Silveira, responsável por analisar e julgar a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho da 10ª Região (MPT10) para denunciar a postura omissiva do Ministério do Trabalho de se abster de divulgar o Cadastro de Empregadores, cujas regras de inclusão estão previstas na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 2016.
Omissão
Na ação civil pública, o MPT10 lembrou a natureza informativa e a inexistência de caráter punitivo do cadastro. Sustentou que a regulamentação da “lista suja” respeita os princípios constitucionais da legalidade, ampla defesa e presunção inocência, bem como atende ao direito fundamento à informação e aos princípios administrativos da publicidade e transparência.
O Ministério Público frisou ainda que a proibição à escravidão é norma imperativa do Direito Internacional, de modo que a publicação do cadastro de empregadores é uma obrigação e um compromisso decorrente de convenções e acordos internacionais assumidos pelo Brasil. Além disso, o MPT registrou que a omissão do Ministério do Trabalho viola o princípio da vedação ao retrocesso no combate à escravidão e destacou que essa omissão também abrange a atualização do cadastro no prazo máximo de seis meses.
Segurança jurídica
Em sua defesa, a União – representada pela Procuradoria Regional da União da 1ª Região – afirmou que a Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 2016, carecia de reformulação e aperfeiçoamento, antes que fosse publicado o Cadastro dos Empregadores. Segundo a PRU, a portaria vigente “coloca em risco sua concretude e higidez”, não conferindo aos administrados segurança jurídica plena em sua aplicação, bem como apresenta “imenso potencial danoso” perante as empresas que querem ajustar sua conduta.
A Procuradoria também alegou que o objetivo do Ministério do Trabalho vai além da publicação ou não da lista, pois a maior preocupação é assegurar a elaboração de um novo instrumento normativo que propicie o respeito aos princípios constitucionais da ampla defesa e contraditório, a fim de evitar a judicialização reiterada da matéria. Para isso, noticiou que foi criado um grupo de trabalho com o objetivo de promover o aprimoramento técnico e jurídico da produção e divulgação do Cadastro de Empregadores.
Política de Estado
No entendimento do juiz Rubens Curado, a omissão na publicação do Cadastro dos Empregadores acaba por esvaziar, dia a dia, a Política de Estado de combate ao trabalho análogo ao de escravo no Brasil, principalmente, porque essa lista já era publicada há mais de uma década e reconhecida, inclusive, por organismos internacionais, como uma das medidas mais relevantes e eficazes no enfrentamento do tema. “E uma Política de Estado, em um Estado Democrático de Direito, não tem exclusividade de atuação, nem pode ficar a mercê de ventos ideológicos pessoais ou momentâneos”, observou.
Segundo o magistrado, o Ministério do Trabalho tem o dever e a responsabilidade pela publicação do Cadastro, mas não sua “propriedade”. Além disso, o alegado risco de judicialização, antes de se apresentar como um receio para a publicação da lista, de acordo com o juiz, deve ser visto, na sociedade democrática atual, como uma garantia de qualquer cidadão. “O Judiciário é e sempre será um caminho seguro para todos aqueles que se sentirem lesados por ato privado ou do poder público”, frisou.
Em sua decisão liminar, o juiz do trabalho reforçou que não se deve perder de vista, em uma perspectiva histórica, que a política de combate à escravidão contemporânea no Brasil avançou nos últimos anos graças à atuação conjunta e articulada de diversos órgãos e instituições, dentre os quais se destacam, entre outros, o Ministério do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal. “Trata-se de tema em que a sociedade brasileira, sob os olhos atentos da comunidade internacional, não admite retrocesso”, salientou.
Constitucionalidade
O juiz Rubens Curado também lembrou que o teor da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 2016, foi referendado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que expressou terem sido sanadas as supostas inconstitucionalidades apontadas no texto normativo. Na ocasião, a União – representada pela Advocacia Geral da União e pela Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Trabalho e Emprego – se manifestou pela plena validade e constitucionalidade do Cadastro de Empregadores.
“Chama atenção a guinada interpretativa da União sobre o tema, que não esconde os ventos de um novo viés ideológico. (…) Passados alguns meses, o cadastro vigente há mais de dez anos passa a ser visto pela União como um fator de ‘imenso potencial danoso’. (…) Assim, sustentar que essa Portaria padece de vícios e afronta os princípios do contraditório e da ampla defesa é, em última análise, contrariar a referida decisão do STF, além de andar na contramão do entendimento outrora defendido pela própria União”, ponderou o magistrado na liminar.
Ainda conforme o juiz titular da 11ª Vara de Brasília, a União não apontou especificamente onde residiriam os alegados “vícios” da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 2016, mencionando apenas genericamente alguns aspectos e alegando ofensa ao contraditório e à ampla defesa, sem detalhar as razões. “Como a inclusão no cadastro, como é por demais sabido, só ocorre após o trânsito em julgado do processo administrativo levado a efeito pelo próprio Ministério do Trabalho, no qual são observados o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, não consigo vislumbrar onde residiria a alegada ofensa a tais princípios”, concluiu.
Ajustamento de conduta
A medida liminar da Justiça do Trabalho do DF também determina que, em caráter excepcional, seja dada oportunidade à União de celebrar acordo judicial ou Termo de Ajustamento de Conduta com os administrados que venham a ser incluídos na primeira publicação do Cadastro de Empregadores e que tenham contra si decisão administrativa final de procedência do auto de infração proferida antes da vigência da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 2016.
Fonte: TRT 10